A Flauta: FINAL ALTERNATIVO

    Final Alternativo...


     Ela agachou-se sobre a cova-rasa e, com as próprias mãos escavou a terra, sem se importar com o quebrar sequencial de suas unhas. Ela ainda nutria fios de esperança de desenterrar seu amado com vida. mas não demorou a desvendar a barba do rapaz, terrivelmente suja de sangue e terra, além, agora, das lágrimas da amada. Ela deitou-se, de forma comovente, sobre o corpo inerte do amado, o pai do filho que ela trazia no ventre, aquele que a levaria num cavalo alado para a felicidade. Com expressão de profundo lamento, ela passou a beijá-lo enquanto fazia promessas de amor eterno. Ele estava muito diferente, estava feio, sujo, irreconhecível. Ela manteve os olhos fechados, buscando na memória a melhor imagem do rapaz, a que lhe encantara desde o primeiro dia. 
     
     Ela abriu os olhos e passou a limpá-lo para recuperar e contemplar sua beleza. Parecia pretender ficar ali para sempre, detida nas melhores lembranças de sua vida. O pouco tempo em que o rapaz permaneceu enterrado, além de sujá-lo e deixá-lo muito diferente, parecia tê-lo deixado mais velho! Ela parecia estar atormentada. Não estava reconhecendo seu primeiro e único amor. No forçar da memória em busca das melhores lembranças, ela voltou a ouvir o incrível som daquela flauta e todos os inenarráveis sentimentos voltaram a povoar o coração dela. Ela continuava a limpar o corpo do seu príncipe encantado, mesmo não entendendo bem o que estava fazendo. Foi tirando a terra de cima do corpo, e a roupa foi aparecendo. Estranho! a estamparia da veste parecia estar de cabeça para baixo! Ela não queria pensar. Ela ouvia ainda o som da flauta e isso a sustentava.
     
     Um susto, um grito. Ela percebeu que havia dois corpos enterrados, um sobre o outro, mas como quem dorme de valete. A flauta continuava a tocar na cabeça dela fazendo o circo do mundo girar. Ela reconheceu seu pai e seu irmão mortos naquela cova. Levantou a cabeça em direção ao matagal e teve uma visão que lhe fez se levantar. Apurou as vistas e, novamente caiu de joelhos. O rapaz caminhava na direção dela tocando sua incrível flauta. Ela não soube o que pensar, nem entendeu imediatamente. Tentou balbuciar algumas palavras, em vão. Diante da necessidade iminente de explicação, o rapaz disse que estava trabalhando quando surgiram pai e filho dizendo que lhe iriam matar. O rapaz estava com sua flauta e num momento de descuido de pai e filho, o rapaz separou ao meio o instrumento de sopro, fazendo aparecer a lâmina de um punhal, com a qual golpeou mortalmente os dois. 

     Ela estava atônita e imóvel. O Rapaz voltou a tocar sua flauta, agora, em tom de marcha fúnebre. Ela recobrou uma pequena parte da consciência, valeu-se do facão que ainda estava à cintura do seu inerte pai. Tinha que vingar  as mortes de seu pai e seu irmão. O rapaz, como que numa indescritível habilidade, esquivou-se dos golpes de facão dela e lhe desferiu uma punhalada direta no coração, fazendo com que ela caísse fatalmente, juntando-se aos parentes na mesma cova.

     O rapaz tinha que continuar. Tocando sua flauta misteriosa, partiu para a próxima fazenda.

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