TINHA UMA PEDRA NO MEIO DO CAMINHO, NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA PEDRA...


     Ele batia cada vez mais forte no seu oponente, mas a cada golpe sofria o revide na mesma intensidade, até que um último golpe acertou-lhe a cabeça mortalmente. Não se poderia cobrar dele uma consciência sobre o efeito bumerangue, pois se a tivesse, certamente, não teria morrido.

     Em sua irracionalidade e cumprindo somente seus instintos selvagens, os ursos-pardos adoram comer mel. Eles são onívoros, sua dieta contém frutas, peixes, carniça, mas entre os alimentos preferidos está o mel. São capazes de fazer qualquer coisa por um pouquinho do líquido viscoso das abelhas. Assim, podem invadir casas e locais que produzem mel, além, é claro, de enfrentar qualquer tipo de abelha.

     Conta-se que uma determinada tribo de índios do Canadá, para capturar os ferozes ursos e deles se alimentarem, inventaram uma eficaz e engenhosa armadilha. Os nativos lambuzavam de mel de abelha uma grande pedra e esta era dependurada, com corda, numa árvore, de modo que ficasse como um pêndulo, à altura de um urso de pé.

     A armadilha era por demais simples e rudimentar, mas era o suficiente para matar um dos animais mais perigosos da natureza. O urso ficava de pé para alcançar a pedra de mel e a tentava lamber, mas a cada movimento do animal, a pedra de mel saía do lugar, voltava e batia na cabeça do urso. O bicho tentava arrancar seu objeto de desejo da amarra que o mantinha no alto. E dessa forma, fazendo uso de sua enorme força, ele empurrava a pedra no ar, fazendo com que esse pêndulo balançasse para todos os lados, voltando sempre na direção do seu ponto de origem, acertando-lhe a cabeça. Agora, além do desejo desenfreado pelo mel, o urso era possuído e movido por desejo de vingança, de revidar os golpes que sofria. E, cada vez mais, ele desferia na pedra suas potentes patadas e, na mesma medida, sofria um sem-fim de contra-ataques. O urso morria, vítima de sua própria força, selvageria e ira, sem se dar conta disso.

     O ser humano, racional e consciente, desde a mais tenra infância ouve os educativos ditados: "Você colhe o que planta"; "Quem boa cama faz, nela deita"; "Tudo o que você faz volta para você"; "O mundo dá muitas voltas"; "Um dia as pedras se encontram"; "Para toda ação há uma reação"; "Gentileza gera gentileza". Ainda nesse viés, há uma cultura religiosa que encerra uma uma oração doutrinária (de São Francisco), fundamentada no Cristianismo, que propõe um comportamento que garante um bom viver, pregando que "é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado". E agraciado com tantos ensinamentos protetivos e instrutivos, o ser humano tem tudo para não agir como um urso idiota.

     Ainda assim, o homem autodestrói-se. O filósofo inglês Thomas Hobbes afirma que "O homem é lobo do homem", o que significa que o ser humano é o seu próprio maior inimigo. E a exemplo disso, estatisticamente, a maioria dos homicídios no Brasil é causada por motivos banais e fúteis, que vão de discussões em mesa de bar, ciúme, disputa por propriedade de objetos sem valor, discussão no trânsito, discussão de vizinhos. No estado de Mato Grosso - BR, no ano de 2016, 70% dos homicídios ocorreram por motivos banais, assim como no estado de São Paulo - BR, no ano de 2012, 83% dos assassinatos tiveram causas fúteis. Dessa forma, o Ministério da Justiça brasileiro chegou a lançar uma campanha nacional denominada "Conte até 10", a qual pretendia que durante essa contagem, o ser humano pudesse se lembrar de que não é um animal irracional, de que não é um urso.

     Humanizemo-nos!

Luis Borsan.

9 comentários

  1. Parabéns meu nobre belíssima obra! Reflete muito bem o vivenciamos hoje na nossa sociedade carente de valores e consciência coletiva!

    ResponderExcluir
  2. Se substituir o mel por mulher, o urso por homem...ainda continua sendo verdade.

    ResponderExcluir
  3. Excelente texto, amigo. Afinal, como você sempre diz "assim como são as pessoas, são os bichos".
    Aguardando o próximo!!

    ResponderExcluir
  4. Essa é a maia pura verdade. Parabéns meu amigo .

    ResponderExcluir
  5. Amo seus textos Amigo Luli. Sempre acertivos e contextualizado com a nossa realidade.

    ResponderExcluir
  6. Excelente texto!
    Assim como o urso muitas pessoas acabam acreditando que se deve devolver as mesmas pedras que lhe foram dada.

    Como o texto deixa claro, toda ação tem uma reação. Por isso é primordial que devemos pensar nos efeitos posteriores de nossa ação.

    Parabéns pela reflexão.

    ResponderExcluir
  7. Ótima reflexão.

    Belíssimo texto, que por sinal é o que estamos vivenciando.
    👋👋👋

    ResponderExcluir
  8. Texto perfeito!!!
    Nos remete a analisar o comportamento do urso com o de alguns humanos da nossa atualidade.

    ResponderExcluir